Carta de Jesus a seus irmãos

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Meus amados irmãos domiciliados na Terra, rogo ao Nosso Pai que nos envolva em Sua Misericórdia.
Já são transcorridos dois mil e treze anos do meu nascimento numa estalagem modesta de Belém, província da Judeia, e após trinta e três anos de convívio com vocês até hoje minha passagem rápida pelo planeta ainda é objeto de controvérsias e querelas, disputas e cisões.


Jamais desejei que isso acontecesse e lamento que perdure tal situação até os dias presentes, estabelecendo no seio de nossa família as divisões de sentimentos, abrindo campo para lutas intestinas em torno do meu espólio.

Nada deixei de material porque nada detive em minha curta existência, sempre pedindo emprestado de amigos e discípulos aquilo de que necessitava para o cumprimento da tarefa que me cabia entre os homens.

Frisei em certa ocasião de que não valia a um homem ganhar o mundo inteiro e perder a própria alma, mas penso que não fui escutado e esse discurso hoje soaria bastante estranho a uma sociedade tomada pela cultura do ter, do possuir.

Mas não desejo aqui penetrar os pormenores da doutrina que lancei na ocasião em que estive fisicamente entre vocês. Ela se encontra devidamente anotada pelos quatros amigos a quem encarreguei de escrever uma espécie de testamento de minhas memórias.

O que me traz aqui hoje é a data de meu aniversário, criada num dia incerto de dezembro, já que nem meus pais deixaram a certeza plena de quando foi que vim a este mundo. Mas entendo a intenção nobre de quem assim procedeu, buscando entronizar na alma do povo minha hipotética data natalícia, buscando com esse gesto evitar o esquecimento de tudo quanto lhes falei um dia...

E nos primeiros séculos após minha partida dolorosa a homenagem sempre me sensibilizou, me fazendo voltar em espírito aos lares onde eu era recordado, ali fruindo de uma prece por alguém articulada e aproveitando a ocasião para fluidificar a água depositada em algum cântaro, valendo-me dela para socorrer um enfermo acamado ou reabilitar alguém em febre alta.

Entretanto, fui notando ano após ano que a data evocativa do meu aparecimento entre vocês foi ganhando estranhos símbolos, como pinheiros, estrelas cadentes, reis magos e outros adereços que, garanto, não estavam presentes na noite de abril em que vim ao mundo por desejo de Nosso Pai.

Isso certamente obedece a algum interesse que aqui não me cabe analisar, mas a cada ano meu aniversário foi ficando mais festivo e menos evocativo, chegando ao ponto de que em muitos lares já não sou mais recordado, ali existindo apenas espaço para um velhinho vestido de vermelho, que chega na noite a mim estabelecida por vocês, trazendo para as crianças brinquedos e guloseimas, partindo logo em seguida para ignorado destino.

Nada tenho contra, porque em certa ocasião frisei que aquele que fala em meu nome a mim auxilia a espalhar a esperança, e todo aquele que atende a um pequenino, a mim atende. Mas igualmente alertei que nem só de pão vive o homem, pelo que o aprisionamento a transitórios bens materiais é sempre fuga da realidade primeira, que é o espírito imortal e sua passageira viagem pelo corpo.

Alguém poderá até dizer que reabilitei corpos perecíveis, e irei confirmar, mas a ninguém por mim ajudado isentei de morrer um dia, ajustando contas com a eternidade.

Dessa forma, vejo meu aniversário desfigurado por uma onda de materialidade que não preguei nem vivi, hoje estando fora da natividade que afirmam ter sido criada para homenagear-me.

Se isso ainda é verdade e se o aniversariante possui algum direito sobre sua própria festa, eu gostaria de rogar a vocês, meus irmãos:

Não ceifemos mais tantas aves para uma ceia farta. Prefiro a singeleza de pão e água.

Diminuamos os excessivos presentes. Aumentemos os gestos de solidariedade a quem sofre e me sentirei presenteado.

Eliminemos os símbolos que dizem me exaltar, inexistentes na noite do meu nascimento. Uma simples reunião familiar, com uma ou duas pessoas em prece e garanto a vocês que lá igualmente estarei como prometi um dia.

Evitemos gastos exagerados com presentes e bolas coloridas, festões chamativos e lâmpadas que deslumbram as retinas, estando estas fechadas muitas vezes para a noite emocional que se abate sobre os famintos e chagados, buscando utilizar esses fartos recursos monetários para socorrer a infância desamparada e a velhice desprotegida.

E por último faço um pedido simples. Quando eu chegar à porta de suas casas, buscando simplesmente adentrar-me no meu aniversário, não me feche a porta uma vez mais.

Nasci numa estrebaria e não numa maternidade.

Morei em lares alheios quase toda a minha vida adulta, sequer tendo uma pedra onde repousar minhas dores e fadigas.

Fui acusado por um crime que não cometi e não tive direito a uma defesa justa, ocorrendo meu julgamento à revelia dos meus atos.

Cercado por doze amigos, fui traído por um, vendido por outro e abandonado pelos demais.

Diante desses fatos que lastreiam minha biografia, rogo o direito de pelo menos estar presente em minha festa de aniversário, se é que ela ainda me pertença.

Com a palavra, meus irmãos.

Deus lhes pague a caridade de me ouvirem.

                                                                                                              Jesus

Eis a carta que recolhemos no correio da vida, a ser depositada na caixa postal de cada consciência.

Que cada um a leia, refletindo que estranho Natal é esse que estamos a cada ano ofertando ao aniversariante.

No ano que vem Ele nasce de novo.

Que desta feita seja na manjedoura de nossos corações.

                                                                                                                          Marta



(Página psicografada pelo médium Marcel Mariano em 11.11.2013, em Salvador/Ba.).